4 abr, 2022
O dia 2 de abril é lembrado como o Dia Mundial da Conscientização do Autismo. A data foi criada pela ONU, em 2007, com o objetivo de transmitir para a população informações sobre o TEA – transtorno de espectro autista e, assim, reduzir o preconceito e discriminação acerca da condição.
Caracterizada pela dificuldade na comunicação social, comportamento, interesses fixos e hipo ou hipersensibilidade a estímulos sensoriais, o TEA é uma condição de saúde com sintomas em diferentes intensidades, os quais variam desde prejuízos leves até a ausência de interação social e atraso mental. Nos casos em que os prejuízos são brandos, a pessoa com autismo tem a possibilidade de estudar e trabalhar, pois, muitas vezes, é possível conciliar as atividades com os sintomas leves.
O autismo é um transtorno que, muitas vezes, não se identifica visualmente, gerando, assim, dificuldades ao acesso a atendimentos prioritários e a serviços aos quais as pessoas com esse transtorno têm direito. Nesse sentido, devido à impossibilidade da identificação, foi sancionada a lei 13.977/20, conhecida como lei Romeo Mion, que criou a Ciptea – Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
O texto, que alterou a lei Berenice Piana (12.764/12), dispõe que a carteira deve assegurar a essas pessoas atenção integral, pronto atendimento e prioridade no atendimento e no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social.
Quais os documentos necessários para emitir a Ciptea?
No requerimento, devem constar (i) nome completo, (ii) filiação, (iii) local e (iv) data de nascimento, (v) número da carteira de identidade, (vi) número de CPF, (vii) tipo sanguíneo, (viii) endereço residencial e (ix) telefone, (x) foto 3×4, assinatura ou impressão digital do interessado.
A lei também exige informações do responsável legal ou do cuidador, como (i) nome completo, (ii) documento de identificação, (iii) endereço residencial, (iv) telefone e (v) e-mail.
Qual a validade do documento?
A carteira terá validade de cinco anos, no entanto, a família deve manter atualizados os dados cadastrais do identificado.
Qual é órgão emissor da carteira?
O documento é emitido por órgãos estaduais, distritais e municiais que executam a política nacional de proteção dos direitos da pessoa com TEA. A família deve apresentar um requerimento acompanhado de relatório médico com a indicação do código da CID – Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde.
Outras legislações
Além das políticas públicas mais abrangentes, é válido destacar outras normas que regulam questões mais específicas, como:
Lei 7.853/89: estipula o apoio às pessoas com deficiência, sua integração social, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do MP e define crimes.
Lei 8.742/93: oferece o BPC – benefício da prestação continuada a pessoa com TEA, desde que o indivíduo não tenha como trabalhar e se sustentar, pois o valor é destinado a quem não possui condições de prover o próprio sustento, nem de tê-lo provido por sua família, além de possuir deficiência.
Lei 8.899/94: concede passe livre às pessoas portadoras de deficiência no sistema de transporte coletivo interestadual.
Lei 10.098/00: estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.
Lei 10.048/00: concede prioridade de atendimento às pessoas com deficiência e outros casos.
Lei 7.611/11: dispõe sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado.
Disponível em:https://www.migalhas.com.br/quentes/362943/conscientizacao-do-autismo-conheca-leis-e-direitos-da-pessoa-com-tea
Acesso em: 04 de Abril de 2022.
31 mar, 2022
Cabe ao hospital demonstrar, em caso de insucesso, que tomou todas as providências adequadas para tentar salvar a vida do paciente. O entendimento foi do juiz Rafael Vieira Patara, da 3ª Vara Cível de Itanhaém (SP), ao condenar o governo paulista e um hospital público por erro médico que levou à morte de um bebê horas depois do nascimento.
De acordo com os autos, a mãe deu entrada no hospital com fortes dores e sangramento. Ela foi internada, mas alegou não ter recebido atendimento adequado dos médicos e das enfermeiras. Em determinado momento, com dores insuportáveis, a mulher se levantou e foi procurar ajuda. Ela disse que uma enfermeira apenas lhe deu um copo de água e pediu que voltasse ao quarto.
Nesse momento, ao tentar subir na cama, a mulher disse que sua bolsa estourou e, sem auxílio de médicos, o bebê nasceu ali mesmo e acabou sofrendo uma queda. Consta dos autos que a criança permaneceu 14 minutos no chão, sem que nenhum enfermeiro ou médico o socorresse. O bebê morreu cerca de 1h30 após o parto.
De início, o magistrado rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo estado de São Paulo. Isso porque, segundo Patara, o artigo 196 da Constituição Federal prevê que a saúde é direito de todos e dever do Estado. “Tanto é assim que constitui competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e da assistência pública (artigo 23, II)” .
Para o juiz, o Estado também é responsável pelo atendimento à autora, tendo plena legitimidade para ser demandado nesse caso. Ao condenar os réus, ele apontou a negligência da equipe médica, que deixou a paciente sem acompanhamento por 1h53: “Pelo fato de que já vinha se queixando de fortes dores abdominais e sangramento, necessitava atenção permanente e atendimento imediato”.
Patara também citou o parecer do Ministério Público indicando que, mesmo diante da gravidade do quadro da paciente, não foi incluída em sua ficha de internação a urgência no atendimento. Além disso, foi apontado ato de violência obstétrica na conduta do hospital de ter proibido que o marido da autora ficasse como acompanhante.
“Caberia aos requeridos comprovar que seus prepostos prestaram atendimento adequado à coautora, o que, todavia, não fora feito nestes autos”, disse o juiz ao reconhecer a ocorrência do erro médico, bem como a responsabilidade dos réus, pois o atendimento se deu com “flagrantes negligência e imperícia”.
Ainda segundo o magistrado, “não resta dúvida” da dor emocional sofrida pela mãe, que viu seu bebê nascer sem qualquer acompanhamento médico e morrer 1h30 depois, bem como a dor física, pois não houve qualquer preparação ou auxílio para o parto, “além do flagrante desgaste emocional do genitor e do irmão do falecido, que geram dano moral passível de ressarcimento”.
Sendo assim, Patara fixou a indenização por danos morais em 300 salários mínimos, sendo 150 para a mãe, cem para o pai e 50 para o irmão do bebê. Por outro lado, o juiz negou o pedido de pagamento de pensão mensal vitalícia à família.
Disponível em: ConJur
Acesso em: 31 de Março de 2022.
24 mar, 2022
Os planos de saúde coletivos podem ser reajustados de acordo com a faixa etária do beneficiário, desde que o aumento obedeça a três regras: tenha previsão contratual, siga normas de órgãos governamentais reguladores e não seja feito aleatoriamente, com aplicação de percentuais desarrazoados.
Essa foi a conclusão da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que nesta quarta-feira (23/3) fixou teses em recursos repetitivos sobre o tema, que é alvo de hiperjudicialização no Brasil. Os enunciados terão observância obrigatória pelas instâncias ordinárias.
O reajuste por faixas etárias nas mensalidades dos planos de saúde coletivos é discutido no Judiciário porque a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) só impõe tetos de valor para os planos individuais e familiares.
Segundo as entidades protetoras dos consumidores, isso permite que as operadoras imponham aumentos abusivos, que acabam por inviabilizar a permanência de beneficiários idosos, justamente o elo mais vulnerável da cadeia e que, em teoria, mais usam os serviços médicos.
As operadoras, por outro lado, defenderam ao STJ que os aumentos são necessários para preservar o equilíbrio financeiro do contrato.
O tema não é novo, sendo que a 2ª Seção do STJ fixou tese, em 2016, definindo regras para reajuste por faixa etária para os planos de saúde individuais e familiares, no Tema 952. Por unanimidade, o colegiado agora entendeu que elas deveriam ser aplicáveis, também, aos planos de saúde coletivos.
Assim, o aumento por faixa etária é possível, desde que tenha previsão contratual, siga normas de órgãos governamentais reguladores e não seja feito aleatoriamente.
Cálculo do reajuste
A segunda tese aprovada pela 2ª Seção do STJ diz respeito aos critérios para definir se o reajuste é desarrazoado. Eles são os definidos pela ANS na Resolução Normativa 63/2003.
A norma limita o último reajuste à idade de 59 anos e diz que ele não pode ser maior do que seis vezes o valor da primeira faixa (de zero a 18 anos). Além disso, fixa que a variação das três últimas faixas (de 49 anos a 59 anos) não pode ser superior à variação acumulada entre a primeira e a sétima faixas.
Havia dúvida, no entanto, sobre como seria feito o cálculo da “variação acumulada” — o termo que vincula os limites para o aumento, de acordo com os percentuais observados em cada faixa etária.
Nesse ponto, a 2ª Seção replicou a tese fixada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas 11 (IRDR 11) para apontar que “variação acumulada” deve ser entendida como “aumento real de preço verificado em cada intervalo, devendo-se aplicar para sua apuração a respectiva fórmula matemática”.
Com isso, o STJ afasta o cálculo da variação acumulada a partir da simples soma aritmética de percentuais de reajuste ou do cálculo da média dos percentuais aplicados em todas as faixas etárias.
Teses aprovadas
A redação das duas teses aprovadas é:
Aplicabilidade das teses firmadas no Tema 952 do STJ aos planos coletivos, ressalvando-se quanto às entidades de autogestão a inaplicabilidade do CDC
A melhor interpretação do enunciado normativo do artigo 3º, inciso 2º, da Resolução Normativa 63/2003 da ANS é aquela que observa o sentido matemático da expressão “variação acumulada”, referente ao aumento real de preço verificado em cada intervalo, devendo-se aplicar para sua apuração a respectiva fórmula matemática, estando incorreta a simples soma aritmética de percentuais de reajuste ou de cálculo de média dos percentuais aplicados em todas as faixas etárias.
Base atuarial do reajuste
O julgamento do STJ também serviria para definir de quem seria o ônus de provar que a base atuarial usada pelo plano de saúde para calcular o reajuste é inidônea: se do consumidor autor da ação ou da própria empresa.
Relator, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino propôs fixar uma terceira tese, segundo a qual esse ônus caberia às operadoras de plano de saúde, pois têm acesso a documentação própria e maior capacidade técnica de produzirem a prova, inclusive diante do baixo número de profissionais atuariais no mercado brasileiro.
Em voto-vista lido nesta quarta-feira, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva sugeriu desafetar o recursos nesse ponto.
Ele afirmou que a jurisprudência do STJ não está formada, pois esse aspecto foi pouco analisado nos julgamentos da turma, devido à aplicação da Súmula 7 (que proíbe reanálise de fatos e provas em sede de recurso especial).
Ainda destacou que fixar uma tese invertendo automaticamente o ônus da prova poderia comprometer exame individualizado e fático de cada caso concreto pelo juízo da causa, além de permitir o ajuizamento da ações com alegações totalmente genéricas.
Por maioria apertada de 5 votos a 4, o colegiado decidiu desafetar e não fixar tese sobre o ponto. Votaram também pela desafetação os ministros Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Luis Felipe Salomão e Isabel Gallotti.
REsp 1.715.798
REsp 1.716.113
REsp 1.873.377
Disponível em: ConJur
Acesso em: 24 de Março de 2022.
21 mar, 2022
Homem tem mantida justa causa aplicada por empresa ao constatar que ele discriminou e ameaçou um colega de serviço por homofobia. O ex-empregado procurou a Justiça pedindo a reversão da pena, mas ficou comprovado por imagens de segurança as ameaças. Decisão é do juiz de Direito Plínio Podolan, da vara do Trabalho de Jaciara/MT.
O ex-empregado procurou a Justiça pedindo a reversão da pena para dispensa sem justa causa. Na ação, disse que não foi homofóbico e que tinha bom relacionamento com todos da empresa, inclusive, foi eleito membro da comissão interna de prevenção de acidentes, como segundo mais votado.
No entanto, em depoimentos, testemunhas contaram que o ex-empregado fez piada com um colega quando este recebia calças novas do superior, que é homossexual. Na ocasião, ele disse que a peça entregue estava sendo devolvida após ser deixada por um na casa do outro.
Após uma série de brincadeiras desrespeitosas e de cunho homofóbico, conforme apurado em sindicância interna, a vítima pediu que o colega cessasse as atitudes. Descontente com a solicitação que lhe foi dirigida optou por adotar postura agressiva.
Assim, juntamente com outro colega, aguardou o fim do turno no estacionamento em que tinha conhecimento que a vítima se dirigiria para enfrentar-lhe de forma hostil e enérgica. A cena foi gravada pelo sistema de videomonitoramento e serviu de prova para a empresa aplicar a justa causa.
Agride a identidade
As filmagens foram analisadas também pelo juiz. O magistrado considerou evidente, pelas imagens que o empregado planejou intimidar ou constranger os colegas de trabalho. Ele acrescentou que o trabalhador dispensado nem sequer poderia falar que reagiu “sob o calor de uma discussão”, pois a ameaça ocorreu quando ambos se preparavam para ir para casa.
“Até esse instante, aliás, eventuais excessos de linguagem, desde que não tenham se configurado em discurso de ódio ou discriminatório, poderiam ter sido corrigidos de maneira pedagógica, com uma advertência e orientação específica sobre o caso, por exemplo. Contudo, a atitude, repito, preordenada de ameaça de lesão física ou mesmo de agressão psicológica causada são graves o bastante para a aplicação da justa causa e a ruptura do liame empregatício.”
Na sentença, o juiz esclareceu que a homotransfobia se traduz em ação ou omissão que “agride a identidade e a orientação sexual das pessoas da comunidade LGBTQIA+, atingindo-lhes o direito humano mais fundamental que é o de viver com liberdade e dignamente”. É por isso, aliás, que o STF equiparou os crimes dessa natureza ao racismo, esclareceu o juiz.
“Considero que o comportamento do autor rompeu a fidúcia inerente à relação empregatícia, na medida em que adotou conduta manifestamente contrária às normas empresariais, legais e sociais de harmonia e boa convivência no ambiente de trabalho, provocando comentários preconceituosos, de teor homofóbico, contra colegas de trabalho e ameaçando-lhes ofender a integridade física e lesando a integridade psicológica.”
Por conta disso, o magistrado concluiu que a empresa exerceu “regular e adequadamente seu poder disciplinar”, não devendo ser a dispensa por justa causa revertida.
Como a pena aplicada pela empresa foi mantida, o juiz negou os pedidos feitos pelo trabalhador para receber as verbas rescisórias que faria jus se a dispensa houvesse sido sem justa causa.
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/361783/juiz-mantem-justa-causa-de-trabalhador-que-foi-homofobico-com-colega
Acesso em: 21 de Março de 2022.
17 mar, 2022
A liberdade de expressão tem limite e quem extrapola esse direito deve ser responsabilizado. Esse foi o entendimento do juiz do Trabalho Bruno Antonio Acioly Calheiros ao manter a dispensa por justa causa de empregada que ofendeu unidade da Drogaria São Paulo no Facebook. Com a decisão, foram julgados improcedentes todos os pedidos da trabalhadora no processo sentenciado na 5ª vara do Trabalho de Guarulhos/SP.
Ao compartilhar post sobre sintomas de exaustão mental, a mulher usou palavrão para apontar suposta contradição entre a boa fama da empresa e o ambiente de trabalho ruim do local. Para o julgador, contudo, a profissional podia recorrer a outros meios, em vez de expor publicamente a insatisfação contra a empregadora. As soluções mencionadas por ele são ação trabalhista com pedido de rescisão indireta (falta grave do empregador) e denúncia ao sindicato ou ao MPT.
“O teor da referida postagem possui o condão de macular a imagem da empresa, a se considerar não somente o teor das menções e apontamentos feitos pela autora, mas também pela direta associação da reclamada ao suposto surgimento em seus funcionários dos males psicológicos e sociais referidos na imagem pela autora repostada.”
Quebra de confiança. É desse modo que o magistrado enxerga a postura da mulher que demonstrou “total falta de prudência”, ao marcar Drogaria São Paulo na postagem e tratar do assunto com terceiros. Na decisão, ele cita também entendimento de tribunais que justificam a dispensa por justa causa por postagens difamatórias.
A justa causa é a falta grave cometida pelo empregado que resulta no fim do contrato de trabalho (art. 482 da CLT). No processo, a mulher não conseguiu reverter essa penalidade para pedido de rescisão indireta. Com isso, deixará de ter acesso a vários direitos como aviso prévio, seguro-desemprego e FGTS.
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/361402/funcionaria-que-criticou-empresa-em-rede-social-recebe-justa-causa
Acesso em: 17 de Março de 2022.
14 mar, 2022
É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja comercial, seja residencial. Essa foi a tese fixada, por 7 votos a 4, pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento virtual encerrado nesta terça-feira (8/3), sob o Tema 1.127 da repercussão geral.
Prevaleceu o entendimento do relator, ministro Alexandre de Moraes, para quem a possibilidade de penhora do bem não viola o direito à moradia do fiador, que exerce seu direito à propriedade ao oferecer seu imóvel como garantia contratual de livre e espontânea vontade, com plena consciência dos riscos decorrentes de eventual inadimplência. Segundo ele, impor essa restrição representaria uma afronta, também, aos princípios da boa-fé objetiva e ao da livre iniciativa.
Ele observou que a Lei 8.009/1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família, excepciona o instituto da fiança (artigo 3º, inciso VII) sem fazer distinção entre a garantia dada à locação comercial ou à residencial. O ministro ressaltou que a constitucionalidade desse dispositivo já foi examinada pelo Supremo, que, no RE 407.668, manteve sua validade, mesmo após a promulgação da Emenda Constitucional (EC) 26/2000, que incluiu o direito à moradia entre os direitos sociais protegidos pela Constituição Federal.
Para o ministro, a criação, por decisão judicial, de uma distinção entre os fiadores de locação residencial, em que se admite a penhora, e comercial ofende o princípio da isonomia. Ele assinalou que a impenhorabilidade do bem do fiador no contrato de locação comercial seria um desestímulo aos pequenos empreendedores, pois, segundo documentos anexados aos autos, mais de 90% dos fiadores são pessoas físicas que entram como fiadores de sua própria empresa (pessoa jurídica) para não recorrer a formas mais gravosas de fiança e evitar a descapitalização.
Alexandre também ressaltou o caráter espontâneo do oferecimento do bem de família em garantia no contrato de aluguel. “Em contrato escrito, que não deve deixar margem de dúvidas, o fiador oferece não só o seu bem de família, mas também todo o patrimônio que lhe pertence, em garantia de dívida de terceiro, e o faz de livre e espontânea vontade”. Afrontar essa garantia, afirma o ministro, citando julgado de Nunes Marques, fere o princípio da boa-fé objetiva.
O entendimento já tinha sido seguido pelos ministros Nunes Marques, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, e a eles se juntaram agora os ministros Gilmar Mendes, André Mendonça e Luiz Fux.
Em voto-vogal, Gilmar acrescentou ao debate a formação da doutrina sobre o direito social à moradia, que culminou na sua previsão no artigo 6º da Constituição Federal a partir da Emenda Constitucional 26/2000.
Para Gilmar, o desenho normativo que determinou a penhorabilidade de bem de família do fiador do contrato de locação é plenamente compatível com a Constituição, e o legislador não efetuou qualquer desvio em sua “atuação conformadora dos direitos fundamentais” ao prevê-la.
Direito à moradia
A divergência foi aberta pelo ministro Luiz Edson Fachin, que considera impenhorável o bem de família dado em fiança de aluguel comercial. Segundo ele, excluir a proteção da moradia do fiador significaria restringir direitos sociais fundamentais e esvaziaria o direito à moradia, que, em seu entendimento, deve prevalecer sobre os princípios da autonomia contratual e da livre iniciativa, “que podem ser resguardados por outros mecanismos menos gravosos”.
No mesmo sentido, a ministra Rosa Weber destacou que eventual desestímulo à livre iniciativa decorrente da impenhorabilidade não é suficiente para suplantar o direito constitucional à moradia, que, na sua avaliação, é um desdobramento de dois outros direitos constitucionais: o da dignidade da pessoa humana e o da proteção à família.
Para a ministra, a imposição de limites à penhora de certos bens é uma “conquista civilizatória”, com o objetivo de assegurar o mínimo existencial. Admitir a penhora do único bem do fiador em nome da promoção da livre iniciativa resultaria na fragilização das normas editadas com o objetivo de preservar a dignidade humana em favor da execução de dívidas. Essa corrente foi integrada, também, pela ministra Cármen Lúcia e pelo ministro Ricardo Lewandowski. Com informações da assessoria de imprensa do Supremo Tribunal Federal.
Disponível em: ConJur
Acesso em: 14 de Março de 2022.